quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Os Irmãos Karamázov: impressões de uma leitora inexperiente





“I love mankind, he said, "but I find to my amazement that the more I love mankind as a whole, the less I love man in particular.” 
― Fyodor Dostoyevsky, The Brothers Karamazov


Foram quase três meses de leitura dos dois volumes desta que é uma das obras mais importantes da Literatura mundial. A experiência inédita e repleta de interrupções (consegui terminar O Silmarillion, alguns livros devocionais e dei uma chance nova para A Eneida) foi, de longe, uma das mais enriquecedoras para mim enquanto leitora inexperiente. Digo inexperiente, porque, para ser sincera, jamais tinha ouvido falar de obras tão importantes quanto essa, tendo em vista o fato de que a minha formação em Letras, apesar de muito boa em alguns aspectos, definitivamente não colaborou para o meu gosto pela leitura dos grandes clássicos.

Não escrevo com a intenção de contar a história, apenas desejo partilhar algumas impressões superficiais no que tange ao desenvolvimento das personagens. Isto não significa, porém, que o enredo deva ser deixado de lado. De fato, para que aqueles que jamais leram tal obra, seria importante conhecer um pouco da narrativa.

Fiódor Dostoiévski escreveu este romance em 1879 e é considerado uma das mais importantes obras das literaturas russas e mundiais, ou, conforme afirmou Freud: "a maior obra da história". Diz-se que o célebre psicanalista considera esse romance, além de Édipo Rei e Hamlet, um importante livro a respeito do embate entre pai e filho em que trata do complexo de Édipo.

Nesta obra célebre e aclamada, a narração se caracteriza por ser muito pormenorizada a partir de uma testemunha dos acontecimentos ocorridos em uma cidade russa. Ao longo da narrativa, o narrador se desculpa diversas vezes por "não ter conhecimento de alguns detalhes" e por considerar seu herói alguém desprovido de fama ou de real importância. Trata-se da história de uma família repleta de confusões e desentendimentos. O patriarca da família, Fiódor Pavlovitch Karamázov, um devasso que ascendeu financeiramente por meio dos dotes de suas duas mulheres e de sua avareza, teve o primeiro filho, Dmitri Fiodorovitch Karamázov, que sobreviveu apenas porque fora criado pelo empregado, Miússov, parente de sua falecida mãe. Teve outros dois filhos com a segunda mulher: Ivan e Aliêksei Fiodorovitch Karamázov, que são criados também por um parente da segunda mulher. Enquanto Dmitri se destaca por ser irascível, Ivan se torna um intelectual que termina enlouquecido por sua própria inteligência. Por sua vez, Aliêksei segue a vocação religiosa e entra para o mosteiro. Após uma disputa financeira entre o pai e seu primogênito, a disputa por uma mulher, Gruchénka, levará ambos a atos que resultarão em uma tragédia.

A obra é divida em quatro partes que contêm, cada uma, três livros, sendo a última parte composta também de um epílogo. Todo o desenvolvimento da obra, como disse anteriormente, está baseado no enredo pormenorizado de como chegou a família à tragédia que levou um dos irmãos Karamázov a responder por ela. Nesse sentido, embora conjecturemos sua inocência, nossa atenção é capturada e mantida por desejar saber de uma vez quem cometera o crime de assassinato.

No que se refere à minha experiência com esta leitura, confesso que esta foi exaustiva e longa. Ademais, a tradução, apesar de não poder comparar com nenhuma outra brasileira, não me agradou muito. Recomendaram-me uma tradução Portuguesa que estou pensando seriamente em adquirir. Não obstante, preciso dizer que Dmitri é, de longe, meu personagem favorito. Via-me como em um espelho a cada atitude impulsiva e obstinada por parte dele. Não é que Aliêksei e Ivan fossem menos importantes, porém, minha reflexão acerca de meu próprio temperamento se deu com o primogênito de Fiódor.

Se eu recomendo a obra? Vivamente! Não somente posso incluí-la na lista dos dez livros que me fizeram uma pessoa melhor (isso será tópico de algum conteúdo do blog no futuro), mas também na lista daqueles livros que absolutamente ninguém pode passar pela vida sem ler.

Boa leitura!


segunda-feira, 18 de abril de 2016



“There is no happiness like that of being loved by your fellow creatures, and feeling that your presence is an addition to their comfort.” 
― Charlotte Brontë, Jane Eyre

Dou início a este texto ainda com as palavras de meu marido na minha memória: “Você não é deste mundo”. De fato, não posso crer que suas palavras tenham para ele o mesmo significado que tiveram para mim. Ora, para ele, esta foi uma expressão de surpresa ao me flagrar estudando mais um assunto pelo qual me interesso muito: histórias. No entanto, para mim, tais palavras ficaram gravadas em meu coração, de modo que me impeliram a escrever – depois de tanto tempo – sobre uma das mais belas histórias que pude ler nesta vida tão cheia de dissabores: Jane Eyre.

Charlotte Brontë, uma das mais talentosas escritoras Inglesas, cujo talento parece ter sido infundido também em suas irmãs, Emilly e Anne Brontë, nos presenteou com uma obra prima que, ouso apostar, não poder ser equiparada a nenhuma outra, no que se refere à categoria romance. O título original, Jane Eyre: An Autobiography, fez com que eu declinasse o convite à leitura por alguns dias, porém a curiosidade e o tempo ocioso das férias terminaram por me lançar ao desafio – E que desafio!

Jane Eyre é uma narrativa em primeira pessoa que se desenvolve a partir de sua infância vivida sob a tirania e abusos de sua tia e primos em Gateshead Hall, até a união com seu amado, Sr. Rochester.

Não é minha intenção dar detalhes deste maravilhoso romance, mas apenas abordar a temática da fidelidade aos princípios que, segundo minha leitura, foram claramente explorados na obra. Jane Eyre pode ser caracterizada como uma mulher forte que sobreviveu a todo o tipo de desventura que um ser humano poderia sofrer. Foi, no entanto, sua invulnerabilidade que me mais me atraiu na sua personalidade.

Após ter sido rechaçada da casa onde morava com a família do tio, Jane Eyre é enviada a um internato onde receberá toda a sua formação escolar, porém não sem sofrimentos, vexações e açoites. Sua vida sofre uma reviravolta quando, terminada sua formação obrigatória, é contratada como governanta em Thornfield Hall, onde conhece Rochester e por ele se enamora.

Após ser pedida em casamento, descobre o segredo terrível que não permitiria que essa união fosse consumada. E é precisamente neste ponto que gostaria de me debruçar. Não havia dúvidas de que o amor de ambos fosse verdadeiro, mas o caráter de Jane Eyre jamais a permitiria aceitar a proposta de Rochester de que ela fosse sua amásia. Ao ser questionada por ele dos motivos que a levavam a lhe negar esse pedido, visto que estava completamente abandonada no mundo, sem possibilidades – afinal, quem se importaria se sua honra fosse ferida? Não havia irmãos, pai ou mãe a quem pudesse atingir com tal decisão – ela responde:

"Eu me importo comigo mesma. Quanto mais solitária, mais sem amigos, mais determinada estou, mais respeitarei a mim mesma. Vou manter a lei dada por Deus; sancionada pelo homem. Vou me agarrar aos princípios recebidos por mim quando eu era sã, e não insana - como estou agora. Leis e princípios não são para os momentos em que não existe tentação: eles são para momentos como este, quando corpo e alma formam um motim contra o seu rigor; rigorosos são eles; inviolados eles serão. Se em minha liberdade enquanto indivíduo eu pudesse quebrá-las, qual seria o seu valor? Eles têm o seu valor – nisto eu sempre acreditei; e se eu não posso acreditar nisso agora, é porque eu estou louca - muito louca: com fogo nas veias, e meu coração batendo tão rápido que não consigo contar suas batidas. Opiniões preconcebidas, determinações precipitadas, são tudo o que tenho nesta hora: E delas eu não arredo pé.”

Após ler algumas análises deste livro, esbarrei em algumas que enxergavam na obra uma espécie de “pré-feminismo”, uma vez que o posicionamento de Jane frente a algumas questões sociais não estaria de acordo com a mentalidade da época. Na minha inexperiência e incapacidade de fazer uma análise profunda e coerente - este não é o propósito do blog - tive de discordar. Ora, a eloquência de Jane Eyre quando questionava determinados valores comuns à época, no meu ponto de vista, não passava de uma manifestação de sua condição enquanto ser humano, criatura e filha de Deus, a quem o respeito, o amor e a proteção lhes eram devidos. Minha leitura me leva a aceitar que, ao negar os apelos do sangue e da carne, nossa personagem principal não estava pensando, como algumas mulheres foram levadas a acreditar, em seus “direitos” aqui neste mundo, mas na vida eterna, no “outro mundo”, nos quais acreditava piamente.
Após fugir sorrateiramente de Thornfield, Jane é acolhida pela família Rivers, cujos membros ela descobrirá mais tarde serem seus primos. Mesmo tendo sido pedida em casamento por seu primo, St John - que fez a proposta não por amor, mas por obrigação - Jane, embora não houvesse qualquer impedimento moral que a prevenisse, não aceita, uma vez que jamais poderia amá-lo. Estranhamente, ela ouve a voz de seu amado chamando por seu nome e volta a Thornfield, onde descobre apenas as ruínas daquilo que outrora se tornara seu lar e motivo de sua alegria.

Como eu disse anteriormente, não tenho por missão expor os detalhes do enredo, mas – se é que tal façanha me é permitida – atrair a atenção de você, leitor, para que tenha a experiência de se deliciar com as linhas deste romance, assim como eu. De fato, não sei se este texto ajudará neste propósito, porém não creio que causará o efeito contrário. Deixo, portanto, que descubra por você mesmo como nossas personagens apaixonadas resolveram seus conflitos.

Jane Eyre é, de longe, uma das histórias mais encantadoras e geniais que já tive a oportunidade de ler. Há poucos dias terminei a leitura do “Morro dos Ventos Uivantes”, de Emilly Brontë. Pude concluir, antes mesmo de escrever este texto, que ambos podem ser considerados inauditos, contudo minha rasa experiência com esse tipo de enredo e com todas as limitações que isto implica, ainda insistirei, por anos a fio, que Jane Eyre será um clássico para mim. Não como outro qualquer, mas daqueles que, de acordo com Ítalo Calvino, ao serem relidos, “oferecem uma sensação de descoberta como na primeira leitura”.




quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Quanto mais, melhor: Paternidade num mundo anti-filhos.




O ano de 2016 teve início com muito trabalho por aqui e desde já peço desculpas pela demora em atualizar o blog. Como eu havia dito, ainda estou aprendendo a  lidar com esta ferramenta e gostaria de contar com a ajuda de vocês.

Bem, o nome do blog reflete bem a variedade de temas que serão tratados aqui e, por este motivo, gostaria de dar uma pausa no assunto Literatura para tratarmos de outro não menos importante: a Família. Esqueça essa onda moderna que tende a classificar qualquer coisa como família. Estamos falando do modelo de família Cristão que dá vida à nossa sociedade através da sua generosidade.

O texto a seguir foi traduzido por mim - apesar do amadorismo - e escrito por Sam Guzman para o site The Catholic Gentleman e pode ser encontrado originalmente aqui. Trata-se de uma reflexão acerca da paternidade - sim, é um assunto que diz respeito a todas as famílias, mas especialmente ao pai de família. Espero que apreciem a leitura e que possam contribuir com mais sugestões de assuntos a serem tratados, afinal, dedico meu tempo a estudar Todas as Coisas.



QUANTO MAIS, MELHOR: PATERNIDADE NUM MUNDO ANTI-FILHOS

“Você sabe o que causa isso?” “Nossa, vocês têm um bocado.” “Fecharam a fábrica, né?” “Vocês vão encher o planeta” “São todos seus?” “Você consegue bancar todos eles?”
Estas são apenas algumas das perguntas que você ouvirá de completos estranhos se você tiver mais filhos que a média nacional aprovada de 1.7. E isso não inclui aqueles olhares maldosos e risinhos na sua direção. Vocês já devem ter ouvido falar da postura corporal de homens que se sentam com as pernas abertas no transporte público ou gordofobia, considerados os últimos ultrajes na nossa cultura politicamente correta. Bem, hoje eu gostaria de adicionar um novo item a essa lista: filhofobia.
Perece espantoso que uma pessoa realmente queira ter mais de 2 filhos. Pressupõe-se que o terceiro certamente foi um acidente. Digo, é fato que filhos te deixam pobres, certo? Eles custam muito dinheiro, não custam? Além disso, eles são uma ameaça ao meio ambiente!! Basicamente, na mentalidade popular, filhos são o equivalente a uma doença sexualmente transmissível—e quem iria querer mais do que duas delas??

FILHOS SÃO O MÁXIMO
Esqueça o que a cultura diz. Filhos são o máximo. Não há nada que se compare a ter duas miniaturas de homens correndo até a porta gritando “Papai!” no momento em que eu entro em casa. Poucas coisas podem se comparar à felicidade de ter bracinhos em volta do meu pescoço, ou ouvi-los dizendo, “ Amo-te, papai”. Ou ver o seu garoto com o boné para trás imitando um jogador de beisebol. Ou lutando ferozmente com guerreiros de brinquedo.
É uma alegria poder ajudar aquele pequeno ser a descobrir o mundo—explorar, aprender, a maravilhar-se diante de quase tudo. É maravilhoso assisti-los exibindo um bigode de leite e dizer, “Eu tenho um bigode igual ao seu!”. Tem também as leituras antes de dormir, frases engraçadíssimas ditas com toda seriedade do mundo, construções de torres imensas com tijolos, vê-los juntar as mãozinhas em oração e ouvi-los dizer o quanto amam a Jesus e Maria. Acreditem, eu poderia dar muitos outros exemplos.
A paternidade é assustadora às vezes, sim, mas na maior parte do tempo, é maravilhosamente feliz. Há momentos em que me sinto cheio de gratidão por tudo isso.
É claro que há momentos de estresse, e frustração, e sacrifício também. Os lençóis molhados; a teimosia em comer comida, ainda que esteja perfeitamente boa; as fraldas cheias; as birras; as idas ao pronto socorro; despesas inesperadas; gripe e infecções de ouvido; gritos de guerra durante a consagração na Missa—você pode imaginar. E eu não tenho dúvidas de que na medida em que eles crescerem, as dificuldades só vão aumentar. Não há amor sem dor. É assim que as coisas funcionam num mundo caído. E como pais mais experientes se apressariam em me lembrar, eu estou apenas começando.

Flechas nas mãos de um guerreiro
Um dos Salmos que eu aprendi a amar é o 127. Ele dá grandes conselhos sobre como confiar a Deus os seus trabalhos e as bençãos que Ele te deu. Mas a minha parte favorita é o final, que diz que os filhos são um presente, não uma maldição:
“Sim, os filhos são a herança de Iahweh, é um salário o fruto do ventre! Como flechas nas mãos de um guerreiro são os filhos da juventude. Feliz o homem que encheu sua aljava com elas…”
Sacou? Aquele que tem muitos filhos é feliz. Nós acabamos de descobrir que o bebê número três está a caminho, e acredite, é verdade—eu não poderia estar mais feliz. Mal posso esperar para receber essa nova vida. Homens, filhos não são coisas pelas quais você deve se desculpar ou se envergonhar. Eles são presentes preciosos com os quais nos regozijamos. Eles são tão lindos e elegantes quanto flechas nas mãos de um hábil e poderoso guerreiro. Só é necessário apontá-los para o Céu.
Concluindo, não deixe que o mundo roube a alegria da paternidade. Ignore os haters*. Sim, você provavelmente teria uma casa maior ou um carro mais maneiro se não tivesse mais filhos. Mas quem se importa? Qual a vantagem de se ter uma casa vazia de risos e alegria? Além disso, um carro não retribuirá o amor que você deu a ele não importa o quanto seja legal dirigi-lo. Eu fico com uma casinha repleta de crianças e uma van enferrujada com várias cadeirinhas de bebês. Sério.
Homens, celebrem seus filhos. Tenham muitos deles. Amem, dediquem seu tempo e atenção a eles, rezem por eles, invistam —mas acima de tudo, valorizem seus filhos. Outras bênçãos passarão, mas os filhos são uma recompensa que durará para sempre.

*Haters - aqueles que são incapazes de se sentirem felizes pelo sucesso de alguém e por isso vivem de apontar seus defeitos.